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Volta às aulas presenciais revive debate sobre uso de celulares em salas de aula.


A adoção forçada do ensino remoto em escolas públicas e particulares em decorrência da eclosão da pandemia de Covid-19 no Brasil acelerou o processo de digitalização da educação no país, fomentando o debate sobre o emprego de ferramentas tecnológicas nas práticas de ensino nos mais diversos âmbitos da pedagogia. O retorno gradual das aulas presenciais, neste sentido, voltou a jogar luz sobre uma antiga questão: o uso de aparelhos celulares em sala de aula.

De acordo com a mais recente 'Pesquisa sobre o Uso das Tecnologias de Informação e Comunicação nas Escolas Brasileiras', do CGI.br (Comitê Gestor da Internet no Brasil), publicada em 2019, com dados referentes ao ano anterior, 57% dos docentes de escolas localizadas em áreas urbanas afirmaram utilizar a internet no telefone celular para desenvolver atividades pedagógicas com os alunos. O índice é semelhante à situação verificada em áreas rurais, em que 52% dos docentes se valeram de seus dispositivos móveis em práticas de ensino com os estudantes.

Em um recorte mais apurado sobre crianças e jovens de 9 a 17 anos, também realizado pelo CGI.br, a pesquisa 'TIC Kids Online Brasil 2019' apontou que 89% da população brasileira desta faixa etária é usuária de internet, sendo que o celular é o principal dispositivo de acesso à internet, sendo o meio preferido por 95% das crianças e adolescentes com hábito de navegação na web.

O uso de celulares em salas de aula, neste contexto de hiperconectividade de crianças e jovens em idade escolar, logo, é um assunto que vem sendo debatido há anos, desde os tempos em que estes aparelhos ainda não haviam penetrado de forma tão profunda neste público.

Em 2007, por exemplo, foi aprovada na Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo) a Lei 12.730/2007, que proibia o uso dos dispositivos celulares, em quaisquer circunstâncias, nas aulas das escolas estaduais. Com o avanço do debate sobre o tema, a legislação foi revista, sendo sancionada, dez anos depois, a Lei nº 16.567/2017, que liberou o uso de celulares em sala de aula para fins pedagógicos.

Em âmbito nacional, há uma proposta em análise na Câmara dos Deputados (PL 104/15) que proíbe o uso de aparelhos eletrônicos portáteis, como celulares e tablets, em salas de aula da educação básica e superior de todo o país, com a ressalva de que eles possam ser admitidos caso haja integração com as atividades didático-pedagógicas e forem autorizados pelos professores. O projeto, apensado a outros de teor semelhante, aguarda parecer da CE (Comissão de Educação) para seguir a CCCJ (Comissão Constituição e Justiça e de Cidadania).

As possibilidades do uso do celular em práticas pedagógicas

Para Sue Ruggeri Cons, diretora da Talent for Education, empresa que apresenta soluções tecnológicas para estabelecimentos de ensino, o uso de aparelhos celulares em sala de aula é algo que não pode ser descartado por professores e coordenadores de escola e colégios, visto que a transformação digital caminha a passos largos nos mais diversos âmbitos da vida social no país.

'Quando se projeta um curso ou se planeja um período de ensino, tal como um semestre, o designer instrucional deve pensar em todas as maneiras que o aluno interage com o conteúdo, além de imaginar quais dispositivos há a sua disposição', afirma, pontuando que 'a cada dia que passa, a oferta de aplicativos educativos para celulares está maior e, cada vez mais, apresentam soluções de aprendizagem e desenvolvimento'.

A afirmação da profissional vai ao encontro das 'Diretrizes de políticas da Unesco para a aprendizagem móvel', que indica que o desprezo pelas possibilidades pedagógicas da utilização de aparelhos celulares em salas de aula, 'representa uma oportunidade perdida'.

'Pela primeira vez na história, o número de aparelhos móveis com internet - sendo a grande maioria telefones celulares - irá superar a população mundial. Entretanto, apesar da sua onipresença e dos tipos especiais de aprendizagem que elas podem apoiar, com frequência essas tecnologias são proibidas ou ignoradas nos sistemas formais de educação', afirma o informe da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura.

Tal entendimento é o mesmo dos especialistas que elaboraram a BNCC (Base Nacional Comum Curricular), que traz as seguintes linhas em sua quinta competência: 'Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva.'

Com efeito, as possibilidades de aumento de engajamento e interatividade proporcionados pelos aparelhos celulares em ambientes escolares, para Cons, merecem destaque. 'Com o uso dos telefones celulares pelos alunos, é possível favorecer a aprendizagem permitindo práticas e realizar dinâmicas e atividades que seriam inviáveis sem eles', diz. 'Na maioria dos casos, ainda melhora a produtividade da aula aumentando a qualidade da aprendizagem e facilitando o gerenciamento de tempo’.

Dificuldades na aplicação desta nova 'cultura digital' em sala de aula, contudo, naturalmente, existem. 'O uso dos smartphones fez com que as pessoas mudassem seus hábitos e atitudes, seja pelo acesso constante à internet ou pela rapidez de resposta de diversos outros recursos. Assim sendo, é imprescindível alinhar essa tecnologia aos conteúdos pedagógicos', afirma.

'O fato de alunos estarem acostumados a ter acesso às respostas para suas questões ao clique de um botão pode causar uma certa ansiedade e suprimir a curiosidade que normalmente é tão importante no ambiente de ensino. Tudo isso se torna um grande desafio para os professores, exigindo deles planejamento e treinamento antecipado', conclui.


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